Rede ObservaRH - Observatório RH da UFRN

[...] O SUS está em todos os municípios do Brasil. Um sistema que até hoje a gente está construindo e que também atua na regulação da formação. Francisca Valda

Entrevista

Francisca Valda da Silva | Coordenadora da Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho do CNS (CIRHRT)

Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), especialista em Metodologia do Ensino e da Assistência de Enfermagem pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com curso sobre Gobierno y Planificación, nível Alta Direcicón (Isla Negra/Chile), graduada em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC), professora aposentada. Na UFRN, desenvolveu atividades de ensino (graduação e especialização), pesquisa e extensão. Coordenadora do Curso de Graduação em Enfermagem (1979-1981 e 1981-1983), Chefe do Departamento de Enfermagem (1992-1994). Participou em Comissões de Estudos Curriculares do Curso de Graduação em Enfermagem e Obstetrícia da UFRN e no Colegiado do Curso de graduação em Enfermagem da UFRN (1979-1983 e 2001-2003). Também foi coordenadora de Programas de Monitoria, Orientação de Projetos de Iniciação Científica. Participou como pesquisadora da pesquisa multicêntrica sobre a prática da enfermagem nas instituições de saúde do país, promovida pelo COFEN/ABEn (1983). Participou da equipe de implantação da Pós-Graduação em Enfermagem no Nordeste, Curso de Doutorado (1992-1993). Coordenadora da pesquisa Análise do processo de construção coletiva da proposta de currículo do curso de graduação em enfermagem da UFRN, junto a PPPG-UFRN (1994-1995). Coordenou do Programa de Extensão Uma Nova Iniciativa na Educação de Profissionais de Saúde em união com a comunidade, envolvendo os departamentos de enfermagem, odontologia, fisioterapia, nutrição, farmácia, medicina, psicologia e educação física. Também integrou a Comissão de Estudos do CCS/UFRN de elaboração de diretrizes curriculares para os cursos de graduação do CCS-UFRN, na perspectiva da formação interprofissional em saúde. Integrou a equipe de docentes da disciplina Saúde e Cidadania – SACI do Departamento de Saúde Coletiva. Atuou como consultor ad hoc na avaliação de projetos com aplicação de recursos do FAP junto a Pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação (PPPG). Tem experiência com ensino de graduação e especialização, capacitação de docentes, estudos curriculares e participação em bancas de concurso público para professor da UERN. Membro da equipe de pesquisadores da Pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasil, realizada pela Fiocruz com financiamento do Cofen (2012-2014) e coordenou a Rede Unida Regional Nordeste 1 (2016-2018). Presidiu a Associação Brasileira de Enfermagem, ABEn Nacional (2001-2004 e 2004-2007). Foi com conselheira titular, representando a ABEn no Conselho Nacional de Saúde (2003-2007 e 2016-2018). Tem ainda experiência na Gestão do SUS, direção do Departamento de Gestão do Trabalho e Educação em Saúde (DGTES), na equipe da Secretaria Municipal de Saúde da Cidade de Natal (SMS-Natal, 2013-2015) e na Subcoordenadoria de Capacitação da Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Norte (SUCA-SESAP-RN, 2015-2016). Participou da Comissão Organizadora da 2ª Conferência Nacional de Saúde das Mulheres, 2ª CNSMu, e da Coordenação da Relatoria da 2ª CNSMu. É membra do GT DCN Saúde da Comissão Inter setorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho (2017). Atuou como Coordenação Adjunta da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (2016/2018) e da Comissão Inter setorial de Saúde das Mulheres (novembro de 2017-2018), e integra o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da UFRN. Em entrevista concedida, em junho de 2023, a Thais Paulo e Gustavo Sobral, do Observatório RH UFRN, pelo Google Meet, a professora Francisca Valda da Silva trata da sua trajetória profissional e do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, do qual é conselheira e integrante da mesa diretoria, e sobre a Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e da sua atuação na ABEn.

Observatório RH: Poderia nos contar um pouco sobre a sua trajetória profissional? Francisca Valda : Meu pai era militar e nossa família, por isso, se mudava bastante. Me criei em Belém, mas vivi em várias regiões do país, no Sudeste, Centro-Oeste, Norte, Nordeste e me formei em enfermagem na Universidade Federal do Ceará. Aqui, em Natal, no Rio Grande do Norte, fiz meu mestrado em Ciências Sociais e aqui chego do Ceará já como docente. Eu era professora da Universidade Estadual do Ceará e tinha feito concurso do DASP para trabalhar em um hospital e escolhi Natal pra viver e aqui eu me aposentei na UFRN. Também tive uma participação relevante na UERN. Um apoio muito forte ao curso de enfermagem da FAEN. Recebi da UERN um título que muito me honra, o de doutora pela UERN, concedido pelo Conselho Universitário em razão da minha participação naquela Universidade. Eu tinha um compromisso comigo mesma, com a equipe e com a Universidade nos projetos de integração docente assistencial e o projeto UNI-Natal. Era um projeto que tinha vários cursos da saúde e que pensava em mudanças no projeto pedagógico dos cursos, isso desencadeou a disciplina nomeada de Saúde Cidadania, na UFRN. A partir daí eu tive uma atuação muito forte na rede dentro da atenção básica e isso me trouxe um compromisso com o controle social. Hoje, eu estou dedicada ao controle social do SUS e atuo como Conselheira Nacional de Saúde pela Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) no seguimento dos trabalhadores da saúde e também coordeno a Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho, sobre a qual também vamos conversar aqui nesta entrevista. Também sou integrante da mesa diretora do Conselho Nacional de Saúde.

Observatório RH: Qual a importância do Conselho Nacional de Saúde? Francisca Valda : O Conselho não é novo. O Conselho foi criado em 1937, em pleno Estado Novo. O Conselho tem uma vida cotidiana e o que marca são as conferências. A primeira foi em 1941 e a mais propagada foi a oitava que antecedeu a constituinte. A oitava Conferência estabeleceu e criou todas as bases para o capítulo da saúde na Constituição Federal de 1988. A Assembleia Constituinte que promulgou a constituição foi em setembro de 1988; em maio, aconteceu uma assembleia dos constituintes com a sociedade civil para propagar a saúde um direito e a criação de um sistema único de saúde. Foi uma ousadia do Brasil. O Brasil é o único país do mundo que tem mais de cem milhões de habitantes e que ousou colocar que saúde é um direito de todos. E isso se deve a mobilização que foi grande no país. O artigo 200 e o inciso terceiro da Constituição dispõem que cabe ao SUS ordenar a formação de recursos humanos em saúde no Brasil. Porque ele é o maior empregador e ele é o maior produtor de serviços, ele tem o enraizamento nacional.

Observatório RH: Poderia nos falar um pouco sobre Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho? Francisca Valda : A comissão articula debates intersetoriais. Nós nos reunimos em intercomissões, com a participação de convidados, como o Ministério Público do Trabalho e outros setores do Ministério da Saúde e de outros ministérios também. É uma comissão que trata da formação do trabalho em saúde e do desenvolvimento da educação e do trabalho e tem impacto na rede na produção de serviços. É preciso garantir uma formação segura, uma formação de qualidade e com uma preparação suficiente. Esse é um dos papéis da Comissão. Como também é a promoção de debates sobre a educação permanente em saúde que não é mais uma formação e, sim, uma política nacional de educação permanente para os profissionais que já estão formados e encontram no SUS, de maneira que tenham uma formação continuada para a vida toda, porque é preciso sempre se atualizar, a medida que surgem novos conhecimentos, novas tecnologias, novos protocolos. Uma educação no SUS para o SUS, na própria rede, aliando teoria e prática. A comissão elabora recomendações, moções, resoluções, notas públicas, é uma comissão muito ativa. Das resoluções do conselho, dois terços são da Comissão Intersetorial de Recursos Humanos. Fizemos um levantamento desse acervo de resoluções. É uma riqueza muito grande para a população e para os usuários do SUS, para as escolas de saúde, os pesquisadores e os gestores em saúde. Nossa visão não é só biológica, nós trabalhamos com a saúde como um conceito que tem múltipla determinações, é racial, é de gênero, é intergeracional, étnico-racial, de orientação sexual, das pessoas com deficiências, a questão do ambiente também, trabalho rural, do campo, da cidade, do ribeirinho, das florestas. A comissão promove e direciona ações para estudos e promove também pesquisa. A comissão elabora notas técnicas e pareceres para subsidiar a mesa diretora. Os pareceres vão para o gabinete do Ministério da Saúde e também para o Ministério da Educação. Avaliamos os cursos de medicina, de odontologia, de enfermagem, de psicologia, dentre os quatorze cursos, para atos autorizativos do MEC. Esses pareceres, que são documentos públicos, às vezes, são arrolados em processos judiciais. Vão subsidiar o juiz, o promotor. E a gente tem reuniões em conjunto com a AGU e com os procuradores dos ministérios. É mais ou menos isso, em linhas gerais.

Observatório RH: E a sua atuação no Conselho? Francisca Valda : Eu sou originária, a minha experiência maior de vida profissional foi na Universidade, porque eu trabalhei também na rede, acompanhando alunos. E na vida profissional na Santa Casa de Misericórdia. A maior escola da minha vida foi a Santa Casa de Misericórdia em Fortaleza, onde eu aprendi a base. Depois que eu vim para Natal foi dedicação exclusiva para a docência. Eu pesquisava e acompanhava alunos e agora eu estou num espaço de formulação de políticas, de normas, marco regulatório. A experiência que eu trouxe está servindo pra fortalecer os meus conhecimentos. Eu tenho assim muito, muito compromisso com o fortalecimento da sociedade civil no Brasil, porque eu estive atuando em instituições, tanto na área da saúde, quanto na área da educação. E eram instituições públicas. Toda vida fui funcionária pública.

Observatório RH: Poderia nos contar um pouco sobre a sua relação com a ABEn? Francisca Valda : Comecei a atuar na ABEn, quando era estudante. Eu tenho o maior orgulho de ter minha carteirinha primeira como sócia da ABEn sessão Ceará. Eu participara dos movimentos sociais, na rua, em passeata, em ato público. Eu acho que um pouco da minha formação evangélica, do culto de igreja, de pregação e de visitar os doentes, sabe? Que eu tinha um trabalho também social na igreja que eu que eu que eu era membra e depois eu trouxe isso para a minha profissão e para a minha vida política: o compromisso com o próximo, com o outro, com os coletivos. Ninguém acredita que essa mulher que está aqui é filha de um militar e que viveu dentro de um quartel e estudou em colégio militar, que é membra da Assembleia de Deus. Uma mulher nordestina, mãe, avó, foram muitas as lições que a vida me deu. Eu ajudei a fundar o sindicato dos professores da UFRN, fui da primeira diretoria, eu estava lá nos movimentos até o dia amanhecer quase para batalhar pela fundação, pra criar ADURN e também para o sindicato de enfermeiras, fui da primeira diretoria dessa sessão que ainda era a associação pré-sindical. Eu era da diretoria e fui presidente da ABEn sessão RN, fui da diretoria de educação de outras diretorias e participei de diversas gestões. Fui também do Conselho Regional de Enfermagem e fui presidente da Associação Brasileira de Enfermagem três vezes, a segunda e a terceira no período da Pandemia. Estou também como representante da ABEn no Conselho e sou da coordenação da Rede Unida.

Observatório RH: Para concluir, quais são, na sua visão, tendo em vista a sua trajetória e toda a sua atuação nestes espaços, os desafios hoje para o SUS? Francisca Valda : O SUS está em todos os municípios do Brasil. Um sistema que até hoje a gente está construindo e que também atua na regulação da formação. Coube ao SUS ordenar a formação dos profissionais da saúde. Técnicos e nível superior, residências e mestrados profissionais. A partir daí, foi muito importante a edição de uma lei orgânica do SUS. A lei 8080. E como ela foi vetada em alguns artigos foi também formulada outra lei, a 8042/1990. Então essas duas leis regulamentam as condições pra existência da comissão intersetorial de recursos humanos e relações de trabalho a CIRHRT. A lei orgânica do SUS estabelece as comissões permanentes. Sempre tive a preocupação que o Brasil precisava de uma sociedade civil forte. Essa minha atuação na participação social do SUS é para mim muito gratificante, porque eu estou fazendo o que eu acredito que eu quero que eu gosto e acredito que estou dando uma contribuição. Colocando um grãozinho de areia na construção. A experiência do SUS pode servir para outras áreas no Brasil. Porque eu acho que a gente está conseguindo fazer isso. Na Pandemia da Covid-19, o SUS teve uma atuação diferenciada. Se não fosse o SUS, se não fosse a participação social do SUS, nós teríamos tido muito mais mortes no Brasil.