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[...] Avaliar as políticas de saúde existentes e analisar se são viáveis ou não tem sido mais um grande diferencial do sanitarista para o aprimoramento dos processos de trabalho. Matheus Rangel

Entrevista

Matheus Rodrigues Rangel | Chefe da Assessoria de Planejamento Estratégico e Gestão do SUS (ASPLAN) da Secretaria Municipal de Saúde de Natal – RN

Entrevista realizada com Matheus Rodrigues Rangel que atua como Chefe da Assessoria de Planejamento Estratégico e Gestão do SUS (ASPLAN) da Secretaria Municipal de Saúde de Natal – RN. Matheus tornou-se bacharel em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte no ano de 2013. A entrevista foi realizada por Thais Paulo Teixeira Costa, pesquisadora do Observatório de Recursos Humanos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Observatório RH: Matheus, vamos começar falando sobre como foi sua trajetória na graduação? Matheus Rangel: Considero que, ao menos até a metade da graduação em Saúde Coletiva, era um aluno comum. Após entrar em contato com o movimento estudantil, passei a me envolver com as discussões do mundo do trabalho sobre a inserção do bacharel em saúde coletiva e isso contribuiu muito com o meu amadurecimento profissional ainda na graduação. As primeiras turmas da graduação tinham um perfil “desbravador”: o bacharel em saúde coletiva ainda era algo novo para a maioria de nós, pois poucas pessoas tinham noção do que era um sanistarista, considerando que ainda não tinham colegas formados. Sempre me questiono se ninguém teve o sonho, ainda jovem, em em ser Sanitarista. Então, compreendo que as primeiras turmas contribuíram com a construção da imagem do bacharel em saúde coletiva sobre que atuação iríamos ter. Hoje vejo como o movimento estudantil me ajudou a amadurecer e a me tornar um profissional melhor. No final da minha graduação, tive a oportunidade de vivenciar um processo seletivo para ser avaliador do Programa de Melhoria para o Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ). Fui aprovado e foi uma experiência muito boa por ter a possibilidade de conhecer o SUS dentro do Rio Grande do Norte. Com isso, diante tantas realidades que conheci, consegui compreender a necessidade dessa formação, de ver a fragilidade da gestão dentro do interior do estado e a potencialidade da formação adequada para o exercício da função como gestor. Após a minha experiência no PMAQ, fui convidado a participar em um projeto no Observatório de Recursos Humanos, que é coordenado pela prof. Janete Castro. Nessa experiência, tive a oportunidade de ser bolsista do CNPq em uma pesquisa voltada para a avaliação da Educação Permanente em todo o Brasil. Foi um momento muito bom para entender como funcionava as secretarias, o movimento da Educação Permanente em Saúde e sua essência no planejamento. Essa experiência me sensibilizou muito para a importância da articulação entre ensino e serviço e de trabalhar a educação permanente de acordo com as necessidades de cada local. Ainda enquanto estava no Observatório, tive também a oportunidade de ser convidado para um processo seletivo na Secretaria Municipal de Saúde de Natal, especificamente no Distrito Sanitário Norte. O pedido de indicações de egressos foi feito à coordenação do curso pelo secretário municipal de saúde, por estar vivenciando boas experiências com egressos nesta secretaria. Nessa seleção, fui aprovado para ocupar o cargo.

Observatório RH: Essa experiência culminou em cursar uma residência multiprofissional, correto? Matheus Rangel: Isso. Enquanto estava atuando no Distrito Sanitário Norte 2, vi que seria interessante parar e buscar me qualificar. Ao sair, deixei claro que estava saindo para me qualificar e trazer um retorno para o serviço, pois ainda é difícil fazer as duas atividades concomitantes. Fui aprovado na Residência Multiprofissional em Caruaru-PE. Essa experiência foi importante para o meu amadurecimento e, um tempo após terminar a residência, fui convidado para assumir a direção na Assessoria de Planejamento Estratégico e Gestão do SUS na Secretaria Municipal de Saúde. Fiquei feliz por voltar à Secretaria e, apesar de estar sendo um enorme desafio, temos conseguido, em equipe, trabalhar muito bem. Estamos buscando aprimorar e qualificar processos de trabalho e introduzir ferramentas na gestão municipal de saúde de Natal.

Observatório RH: E como tem sido atuar, compartilhar processos de trabalho e idealizar propostas com outros colegas da graduação na Secretaria Municipal de Saúde de Natal? Matheus Rangel: É muito gratificante, pois retomo a minha militância no movimento estudantil. Os egressos que estão na secretaria são frutos de articulações de alunos, egressos e professores. Fico muito feliz em ver que os setores da Secretaria Municipal de Natal almejam o bacharel em Saúde Coletiva em seus departamentos. Os primeiros colegas fizeram com que o êxito do seu trabalho abrisse portas para outras pessoas. Então, atuo buscando ampliar a oportunidade para que os colegas que estão na secretaria consigam se envolver no espaço da melhor maneira possível e para continuar abrindo espaço para outros. A primeira coisa que fiz, quando assumi o cargo, foi entrar em contato com os preceptores da graduação e, ao saber que não iria receber estagiários naquele momento, busquei identificar onde estavam os estagiários e articular com eles alguns projetos os quais achava que eram estruturantes, considerando, também, as ideias deles. Hoje estou com dois estagiários da graduação. Devo pensar que o meu trabalho abre portas para outras pessoas, assim como o trabalho de outras pessoas abrirão portas para mim. Por isso, busco olhar tanto para os colegas que estão formados como para aqueles que ainda estão em graduação, pois vejo que, com boas experiências, abriremos portas uns para os outros.

Observatório RH: Poderia nos falar um pouco sobre o seu trabalho na Secretaria Municipal de Saúde de Natal? Matheus Rangel: O departamento no qual atuo permeia toda a Secretaria Municipal de Saúde de Natal e, assim, venho discutindo, em conjunto com esses departamentos, os processos de decisão de gestão e políticas que permeiam a secretaria. A ASPLAN é um local onde posso atuar de forma transversal dentro da secretaria e contribuir para estruturar os processos operacionais. Vejo que todo o meu percurso me ajudou para estar hoje nesse departamento, dentro desse desafio. Todos os locais em que tive a oportunidade de trabalhar contribuiram com a prática que tenho hoje no departamento. Sempre existiu um abismo entre a gestão e a “atenção em ato” a ponta do serviço, como chamamos. Esse distanciamento é o que me faz ter uma enorme atenção estando hoje no nível central. Hoje busco realmente aproximar os processos de decisão aos processos do fazer do cotidiano em saúde. Compreendendo a importância do planejamento para o processo de trabalho e, por isso, venho tentando discutir e contribuir na secretaria com uma forma de levar o planejamento para dentro dos serviços. Por exemplo, de forma descentralizada, procuro discutir com as unidades básicas para que os relatórios de gestão sejam vistos e utilizados de forma mais prática e usual e não se tornem apenas instrumentos burocráticos, mas sejam vistos como instrumentos gerenciais e que sirvam no dia a dia do processo de trabalho para o planejamento de sua construção diária de resultados e indicadores. Muitas vezes, ao analisarmos a programação, relatórios quadrimestrais, relatórios anuais, deparamo-nos com uma falta de cuidado a esses instrumentos. E isso deve ser o contrário, pois precisamos ver esses instrumentos dentro do processo de trabalho, do planejamento, para acompanhar como minhas ações estão sendo feitas e acompanhar meus resultados. Por isso, falo da importância de se trabalhar com o desenvolvimento tecnológico, seja ele dentro dos processos da secretaria, nos memorandos, abertura de processos, comunicação interna, ou seja, por captação de informações com os profissionais através dos sistemas de informação. Isso é importante para que a gente melhore e otimize o nosso processo de trabalho da saúde, diminua os trabalhos repetitivos e melhore as qualificações das informações que são feitas no dia a dia. Além do mais, para que a gente possa melhorar a nossa capacidade gestora, nossa capacidade de diagnosticar essas informações e melhorar os nossos planejamentos para que possamos ter mais ações efetivas e mais eficazes.

Observatório RH: Como você analisa, a partir do que tem vivenciado, as contribuições do Bacharel para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde? Matheus Rangel: O primeiro diferencial é a visão ampla que o egresso em saúde coletiva possui do SUS e da sua articulação com os demais serviços. Alguns profissionais tendem a olhar apenas para seu próprio processo de trabalho, o que gera diversas fragilidades. Então, essa visão holística da rede de serviços é um dos grandes diferenciais da nossa formação. Outro ponto é a nossa capacidade de discutir e compreender as politicas públicas, analisar e avaliar os seus impactos e sua viabilidade, tudo isso pensando nos usuários que utilizam os serviços. Avaliar as políticas de saúde existentes e analisar se são viáveis ou não tem sido mais um grande diferencial do sanitarista para o aprimoramento dos processos de trabalho. Outro ponto que percebo é que esta atenção, para avaliar e monitorar o nosso processo de trabalhando, ocorre na tentativa de contribuir para melhorias ao SUS.

Observatório RH: Matheus, se você pudesse deixar um recado para um estudante de graduação, que está entrando agora na graduação em Saúde Coletiva, o que você diria para ele? Matheus Rangel: Diria para ter força e coragem. Existem muitos monstros em nosso dia a dia, mas, se a gente tiver coragem, vontade e um bom direcionamento, a gente consegue desmistificar esse monstro e torná-lo pequeno e manso, digamos assim. Temos formação para isso. Temos orientação e instrumentos. Então, falta só vontade e perseverança. Há muitas questões que podem nos desistimular até mesmo quando estamos dentro do serviço, mas buscar sempre compreender o motivo e o histórico das situações faz com que tenhamos força para agregar outras pessoas a lutar contribuir com o SUS, que carece de todo o cuidado.